domingo, 2 de dezembro de 2012

Entrevistados do I Concurso de Poesia Autores S/A (2011)


Caros, leitores: todas as entrevistas abaixo foram realizadas no ano de 2011, pelo autor Lohan Lage, durante o período do I Concurso de Poesia Autores S/A. Os entrevistados contribuíram gentilmente com seus pareceres neste certame poético.

Entrevista com: Márcia Barbieri
Márcia Barbieri é paulista. Formada em Português/Francês pela UNESP, pós-graduada em Prática de Criação Literária, organizado pelo escritor Nelson de Oliveira. Tem textos publicados nas revistas literárias “Coyote”, “Polichinello”, “Cronópios”, “Germina”, “Escritoras Suicidas”, “O Bule” e “Meio Tom”. Lançou em 2009 o livro de contos “Anéis de Saturno”, pelo Clube de Autores. Lançará em julho de 2011 o livro de contos intitulado “As mãos mirradas de Deus”, pela editora Multifoco. É colunista das revistas literárias eletrônicas “O Bule” e “Sinestesia Cultural”. Foi colunista da revista eletrônica “Caos e Letras”. Edita o blog: A Vida Não Vale Um Conto. E-mail: marcia_barbieri@hotmail.com
Lohan: Nós, organizadores deste concurso de poesia, estamos bastante felizes com sua presença como jurada convidada desta rodada. Algumas pessoas criticaram o modelo deste concurso, alegando ser uma espécie de "BBB poético", além da exigência que há na entrega do poema dentro de um determinado prazo. O que você pensa a respeito deste concurso? Você acredita que o prazo determinado pode ser prejudicial à escrita do poeta?
Márcia: Todo concurso é um estímulo aos poetas, acho uma iniciativa maravilhosa, afinal não é um trabalho fácil organizar um concurso. É claro que escrever dentro de um prazo é sufocante e talvez possa interferir um pouco na criatividade, no entanto, ao mesmo tempo, dá oportunidade que o poeta apresente trabalhos anteriores que se encaixem na proposta, já que o tema, neste caso, é bem abrangente.
Lohan: Qual foi sua impressão geral em relação aos poetas finalistas, de acordo com os poemas apresentados a você nesta etapa?
Márcia: Tem poemas muito bons, entretanto, por se tratar de um tema muito explorado (“O Velho e o tempo”), muitos escritores acabam se perdendo em imagens e metáforas gastas, o que acaba empobrecendo os seus escritos.
Lohan: Enfim, gostaríamos que você deixasse uma mensagem aos poetas competidores e aos poetas, em geral. Afinal, existe a receita da boa poesia? O que mais te encanta em um poema?
Márcia: Odeio falar em receitas e não acredito em fórmulas mágicas. O que mais me encanta em um poema são as imagens, as metáforas. O poema precisa emocionar, surpreender. Gostaria também de enfatizar que toda leitura é subjetiva e não encerra verdades, é apenas a verdade de alguns. Boa sorte a todos.
Entrevista com: Edson Kenji Iura
Edson é nascido e residente em São Paulo. Trabalha na área de informática. Desde 1991 é devotado à prática do haicai como membro do Grêmio Haicai Ipê. Seleciona haicais de leitores para publicação no “Jornal Nippak”. Pioneiro na divulgação do haicai brasileiro na internet como editor do "Caqui" (www.kakinet.com), primeira revista eletrônica em português exclusivamente dedicada ao assunto, fundada em 1996. Administrador do fórum eletrônico "Haikai-L", o primeiro na internet dedicado ao haicai brasileiro, fundado em 1996. Jurado de concursos de haicai. Tem haicais publicados em antologias. E-mail: kakinet@gmail.com
Lohan: Edson, é um prazer, primeiramente, recebê-lo aqui, no Autores S/A. Você, um dos maiores mestres do haicai brasileiro, faz parte do Grêmio Haicai Ipê (GHI), um grupo de haicaístas especializados, responsáveis por estudar e compor haicais. Conte-nos um pouco mais sobre este Grêmio.
Edson: O Grêmio Haicai Ipê foi fundado em 1987 por entusiastas do haicai, sendo o primeiro grupo de estudo e composição de haicais em português do Brasil. Mantém suas reuniões em São Paulo, ininterruptamente, desde então. Promove eventos como o Encontro Brasileiro de Haicai, o Concurso Brasileiro de Haicai Infanto-juvenil e o Concurso de Haicai Goga Masuda. Seu inspirador é o poeta Goga Masuda (1911-2008), mestre que escreveu haicais em japonês e português.

Lohan: Nós, organizadores, decidimos criar uma padronização nas postagens dos poemas do concurso: postamos de acordo com a ordem alfabética dos títulos dos poemas. Sendo assim, pedimos aos poetas participantes que empregassem um título aos seus haicais (embora saibamos que seja uma atribuição facultativa). O que pensa a respeito desta nossa decisão? Por que um haicai não carece de um título?

Edson: Relembrando o mestre Goga, "o haicai é um diálogo entre autor e leitor". O que importa é a interpretação que o leitor dá ao texto do autor. Na maioria das vezes, o título direciona a decifração do poema, quando não se transforma num simples atalho para que o autor imponha a sua visão. Além disso, numa forma tão curta, acaba funcionando como um quarto verso, somando gordura ao texto. Tentei ignorar os títulos durante os julgamentos.

Lohan: Em uma entrevista concedida a Rodrigo de Souza Leão (site Garganta da Serpente), você afirma, em uma de suas respostas, que não é um escritor por profissão, mas sim, apenas um médium. Como você definiria essa mediunidade, em relação aos seus escritos?
Edson: Essa entrevista deve ter mais de dez anos. Quis dizer que me vejo mais como facilitador do que produtor. Através de minha atividade na internet, procuro aproximar as pessoas do haicai.
Lohan: Pra terminar, pergunto-lhe qual autor, ou quais autores, você considera o grande(s) nome(s) do haicai no Brasil? Que obras você recomenda àqueles que desejam trilhar o caminho dos haikus?
Edson: Entre os autores vivos, quero citar todos os poetas do Grêmio Haicai Ipê, é claro. Num degrau acima, a senhora Teruko Oda, certamente a melhor entre eles. Paulo Franchetti, professor da Unicamp, é o grande intelectual do haicai brasileiro, que também começa a se destacar como poeta. E, num registro um pouco diferente, Alice Ruiz, uma poeta de alcance popular, que dedica um grande espaço de sua criação ao haicai. Livros: enquanto Paulo Franchetti não reedita o seu necessário "Haikai - antologia e história" ou lança uma outra obra de fôlego semelhante, a melhor referência que posso dar é em língua inglesa: "Traces of dreams - Landscape, Cultural Memory, and the Poetry of Basho", do nipo-americano Haruo Shirane, uma leitura apaixonante para todos os amantes do haicai e da poesia em geral.
Entrevista com: Vera Americano
Vera nasceu em Minas Gerais. De família goiana, residiu entre Goiás e Rio de Janeiro e, mais tarde, em Brasília. Estudou Letras na Universidade de Brasília (UnB), e fez mestrado em Literatura Brasileira na Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro (PUC/RJ). Foi professora de teoria da literatura na Universidade Santa Úrsula, no Rio de Janeiro. Em Brasília, trabalhou no Centro Nacional de Referência Cultural (CNRC), na Fundação Nacional Pró-memória e na Consultoria Legislativa do Senado Federal, para a qual se habilitou mediante concurso para o exercício da função na área de cultura e patrimônio histórico.
Sobre a sua poesia, disse o filósofo e poeta português Agostinho da Silva: “A sua exactidão é um caminho para o divino, não um fim em si própria: o seu reino não é a oficina, mas um céu indistinguível da terra. A sua forma perfeita seria o hai-kai, o contado número de sílabas para conter o máximo de emoção. (...) E os há em seus poemas.” Publicações: “A Hora Maior”, poesia, 1º prêmio da União Brasileira de Escritores, 1970; “Viaje ao reino de Cora Coralina”, ensaio, El Urogallo, Madrid, 1996; “Arremesso livre”, poesia, Rio de Janeiro, Editora Relume Dumará, 2004; “Os Cine-jornais sobre a construção de Brasília”, ensaio, MinC/SPHAN/Pró-memória, Rio de Janeiro, 1988;  Participação em: antologias (“Poesia de Brasília”, organização de Joanyr de Oliveira; “Deste Planalto Central”, organização de Salomão Sousa, entre outras); suplementos literários e revistas (“Poesia Sempre”, Fundação Biblioteca Nacional; “Tropos”, Michigan State University, entre outras); sites, blogs e revistas eletrônicas (“Cronópios”, “Casa das Musas”, “Máquina do Mundo”, “Diversos afins”, entre outros).
Lohan: Vera Americano, primeiramente, é um imenso prazer recebê-la aqui, neste evento poético virtual de âmbito nacional. Vera, eu já li um livro de sua autoria, o “Arremesso Livre”, e também alguns poemas encontrados apenas na Internet, em sites como o do Antônio Miranda (www.antoniomiranda.com.br). Percebe-se uma singularidade incomparável, pelo menos sob meu ponto de vista, em sua poesia, bem como um teor hermético que instiga o leitor. Plagiando a pergunta que Júlio Lerner fez à Clarice Lispector numa de suas entrevistas, você se considera uma escritora hermética? Afinal, o que é o hermetismo para você?
Vera: Se há hermetismo, acredite, não é intencional. Possivelmente, minha opção pela economia e pela concisão do verso possa levar a esse juízo. Ocorre que, como efeito direto da concisão, o texto poético carrega consigo várias e generosas camadas de sentido, o que, por sua vez, pode suscitar múltiplas leituras. A meu ver, uma dicção prolixa, ao contrário, entrega ao leitor o poema decantado, o que pode lhe arrefecer o ímpeto de atribuir aos versos novos sentidos nascidos de sua própria leitura. É bom ressaltar, no entanto, que, obviamente, não se trata de uma regra geral. Há primorosas e magistrais exceções, poetas que são autênticos ícones, cuja opção pelo poema de longo curso não cala as muitas vozes de suas obras. No meu caso específico, a economia verbal é uma das formas utilizadas para se alcançar o que se poderia chamar de efeito poético, o que tem a ver com a emoção, com o envolvimento, com a surpresa.
Lohan: Meu primeiro contato com seus poemas foi pela Internet. Muitos poetas sofrem com o anonimato e com a não valorização editorial de suas poesias. Haja vista esta problemática, a utilização desta ferramenta (Internet) para a divulgação da poesia estaria se dando de modo emergente?
Vera: Sim, não há dúvida. Mesmo os autores apegados ao papel, à edição convencional, têm se rendido ao imenso vigor demonstrado pelas novas mídias. É conhecido o árduo caminho que um poeta precisa trilhar até o prelo de uma editora. Democraticamente, a web tem expandido as possibilidades de divulgação da poesia e, por isso mesmo, anda provocando um merecido e saudável reboliço. A meu ver, a facilidade oferecida por esse caminho tem favorecido, também, a proliferação de uma certa gratuidade, o que, no entanto, não ofusca nem a significativa produção de qualidade disponível nesse meio, nem a revelação de novos talentos.
Lohan: O modo de eliminação deste concurso se dá através da soma das notas dos jurados e, posteriormente, pela decisão do público (voto pela enquete). O que você pensa a respeito dessa interação do público no concurso? Existe justiça neste modo de eliminação ou esse molde (voto popular) banaliza a poesia?
Vera: Não banaliza, de forma alguma. Entendo que o voto popular, geralmente carregado de subjetividade, é muito importante para testar o apelo dos poemas concorrentes. Essa tal de subjetividade - fator concorrente em qualquer avaliação de um texto literário - dificilmente deixa de existir, a menos que se lance mão de parâmetros analíticos de natureza estritamente técnica. Assim, à parte o juízo mais crítico e, digamos, mais especializado dos jurados, a participação popular, como já afirmei, me parece muito importante. Além disso, não se pode deixar de valorizar esse tipo de interação do ponto de vista do incentivo e do despertar do gosto pela leitura de poesia. Nesse sentido, em particular, a iniciativa dos Autores S/A é admirável e merecedora de todo aplauso.
Lohan: Nesta etapa do concurso, os poetas competidores produziram haicais. Lido os haicais, peço-lhe que deixe uma mensagem a todos eles e, também, ouso lhe pedir: por que não um haicai de sua autoria, especialmente para o concurso?
Vera: Vamos lá, poetas! É chegada a rodada dos haicais! Não parece excessivo rememorar que o haicai (ou hai-kai, como no original japonês), forma poética de reduzidas proporções e de grande impacto, tradicionalmente ligado à observação da natureza, traduz, com extrema concisão, um olhar, uma sensação, uma impressão. De um só fôlego, o poeta transmite, por exemplo, uma mínima fração do tempo, um roçar de asas, a queda de uma pétala. De essência contemplativa, abrindo espaço para a reflexão, o haicai lança mão de uma linguagem poética sutil e delicada, mas, ao mesmo tempo, direta e objetiva, dispensando adornos, metáforas, devaneios.
O maior desafio recai na escolha das palavras. Já que são tão poucas, elas costumam ser extremamente precisas: o flash de um efêmero instante contido no total de escassas 17 sílabas poéticas. Originalmente, o haicai dispensava a rima, mas a tradução ocidental fez com que o primeiro verso, quase sempre, rimasse com o terceiro. No entanto, autores de reconhecida competência na composição de haicais dispensam a rima. Assim, desde que mantidas as regras estabelecidas pelo concurso relacionadas à metrificação (o primeiro verso com 5 sílabas poéticas, o segundo com 7, o terceiro com 5), à necessidade de titulação e às características essenciais inerentes ao gênero, os haicais foram bem-vindos, com ou sem rima.
Parece-me indispensável frisar que os haicais concorrentes formam um precioso conjunto de muito bom nível. A regra de atribuição de título, estabelecida pela organização do concurso, foi habilmente explorada por grande parte dos concorrentes. Esses poetas converteram a obrigatoriedade em um eficaz recurso: a atribuição de uma chave para a leitura e consequente ampliação da voltagem poética de seus versos.
A todos os poetas concorrentes, meu louvor, meu incentivo! Que se abram à serenidade, à inspiração e ao trabalho! E que venha a poesia!
Boa sorte a todos! E a propósito:
ZEN
sábia perfeição:
as corolas da manhã
aguardam a sombra.
Autora: Vera Americano
(Poema inédito de Vera Americano, concedido especialmente para o I Concurso de Poesia Autores S/A).
Entrevista com: Geraldo Lima
Geraldo nasceu em Planaltina (GO), em 1959, e mora em Sobradinho, DF. Formado em Letras pelo CEUB e Francês pela Aliança Francesa de Brasília, trabalha como professor de Língua Portuguesa e Literatura Brasileira na SEDF. Escritor e dramaturgo, publicou os livros “A noite dos vagalumes” (contos, Prêmio Bolsa Brasília de Produção Literária, FCDF), “Baque” (contos, LGE Editora/FAC), “Nuvem muda a todo instante” (infantil, LGE Editora), “UM” (romance, LGE Editora), “Tesselário” (minicontos, Selo 3x4, Editora Multifoco) e “Trinta gatos e um cão envenenado” (peça de teatro, Ponteio Edições). É colunista dos sites “O Bule” www.o-bule.com e “Portal Entretextos” http://portalentretextos.com.br. Colabora com o “Jornal de Sobradinho”, DF, com o “Jornal Opção”, em Goiânia, e com a revista “TriploV” www.triplov.com. Mantém o blog Baque: www.baque-blogdogeraldolima.blogspot.com. E-mail: gera.lima@brturbo.com.br
Lohan: Olá, Geraldo. Primeiramente, é um prazer recebê-lo aqui, no blog Autores S/A. Muitos programas midiáticos, ultimamente, têm apresentado uma crítica social muito bem construída sob a égide da sátira, do bom humor. Eu os chamo de neo-gilvicentinos. Você aprecia este tipo de crítica? Não estaria havendo uma banalização desta crítica, considerando-se o extenso número de profissionais que se utilizam desta atitude satírica e cômica para dirigirem suas críticas?
Geraldo: Primeiro, quero agradecer pelo convite e espero contribuir para o sucesso do evento. De fato, tem surgido um número considerável de programas midiáticos que exploram esse filão do humor com um viés de crítica social. Penso, no momento, num programa como CQC. Há boas tiradas ali e enfoques contundentes de questões sociais que afligem o dia a dia da população mais carente. Tem funcionado. Agora, se a fórmula se repete ad nauseam, a tendência é perder a eficácia. Gosto, particularmente, do humor corrosivo, que deixa à mostra o ridículo de certas convenções sociais e de comportamentos travestidos de falso moralismo. Aí temos que lançar o olhar para o passado e nos lembrarmos de Aristófanes, Gil Vicente, Molière, no teatro, e, na poesia, da sátira de Gregório de Matos Guerra e de Luiz Gama.
Lohan: O tema desta etapa do concurso é a Crítica Social. Muitas obras literárias e musicais são responsáveis por belas e eficazes críticas sociais. Um bom exemplo é a canção “Que país é este?”, da saudosa banda Legião Urbana. Geraldo, afinal, que país é este?
Geraldo: Ainda estou à procura da resposta também. Mas dá pra intuir algumas coisas. Digo que temos uma cultura variada, riquíssima, única, que poderia funcionar como a base de propulsão para nos projetar de fato no tão vaticinado “País do futuro”. Mas, paralelo a isso, a essa cultura impressionante, corre a vileza, o mau-caratismo, a desumanidade de gestores públicos e políticos que nos impedem de avançar. Soma-se a isso a impunidade patrocinada por uma Justiça frouxa e ineficiente e tem-se o retrato de um país fadado a viver da expectativa de se tornar grandioso. Como diz a letra da música da Legião Urbana: “Ninguém respeita a Constituição/mas todos acreditam no futuro da nação”.
Lohan: Um texto, para I. Kant, só é tratado como literatura quando consegue gerar, de alguma forma, um resultado estético - quando gera alguma forma de sensação no leitor, seja prazer ou outra emoção. Qual a sensação que a poesia lhe causa? O que é uma poesia de qualidade, na sua opinião? Você aconselharia aos poetas desta competição a se manterem numa linearidade estilística ou a ousarem e explorarem novos vieses literários?
Geraldo: Uma das funções do texto literário é causar esse prazer estético de que nos fala Kant. E mesmo quando se propõe a fazer crítica social, não pode se esquecer de que se trata, primeiramente, de um texto literário. Como disse Ezra Pound, literatura é linguagem carregada de significado. No caso da poesia, o tratamento que se dá à linguagem é no sentido de provocar o estranhamento, a surpresa, o encantamento, a reflexão. Em mim, a poesia causa arrebatamento. O que procuro na leitura de um poema, em primeiro lugar, é esse estranhamento, esse choque por me encontrar diante de algo aparentemente inapreensível pelo filtro da razão. É só depois mesmo que se deve fazer uso da razão para entender o poema, como nos ensinou Octávio Paz. Considero que há poesia de boa qualidade quando o poeta conjuga de maneira equilibrada forma e conteúdo, deixando transparecer seu estilo, sua alma, ou seja, aquilo que o torna original. A busca dessa originalidade é imperiosa na modernidade. Ousar se torna, então, algo importante. Mas dizer, aqui, que cada poeta desta competição deve romper com a linearidade estilística e procurar novos vieses literários é bastante complicado. Penso, nesse caso, em Drummond, autor de uma poesia que apresenta uma grande variedade temática e técnica, e João Cabral de Melo Neto, cuja poesia aborda poucos temas e apresenta uma variação estilística mínima. E os dois, obedecendo à própria sensibilidade, são geniais.
Lohan: Pra terminar, qual mensagem você deixa aos poetas em relação ao tema desta rodada (Crítica Social)?
Geraldo: Fazer poesia de cunho social, ou de crítica social, não é fácil. Exige que o poeta saiba dosar com justeza forma e conteúdo, para que o caráter de crítica às mazelas sociais não se sobreponha demais àquilo que é próprio da poesia: o ritmo, o sentido plurissignificativo da linguagem poética, a capacidade de surpreender. Do contrário, o poema vira apenas um instrumento de crítica social, caindo, muitas vezes, no panfletário. Lembro-me de muitos poemas da década de setenta, no auge da repressão militar, que criticavam duramente a ditadura e professavam o advento da liberdade. Hoje, relendo-os, vejo o quanto são verdadeiros na intenção de querer mudar a realidade, porém, quando vistos a partir da estética, da análise literária, apresentam-se pobres, inexpressivos poeticamente. São poemas engajados sem nenhuma poesia. Bem intencionados, mas apenas isso. Penso que Castro Alves, Carlos Drummond de Andrade e o Ferreira Gullar menos ligado ao partido são bons exemplos de como fazer um poema de crítica social sem perder o sentido do poético. Posso encerrar dizendo que o melhor conselho de como se portar na feitura do poema foi dado por Drummond no poema ‘Procura da poesia’. Não há como errar depois de lê-lo. Sucesso e boa sorte a todos!
Entrevista com: Nonato Gurgel

Nonato é doutor em Ciência da Literatura pela UFRJ e professor de Teoria da Literatura da UFRRJ. É autor de "Luvas na Marginália - escritos em torno da poética de Ana C" (no prelo). Divulga as suas produções culturais e acadêmicas no blog Arquivo de Formas: http://arquivodeformas.blogspot.com/
Lohan: Olá, Nonato Gurgel. Primeiramente, é um prazer imenso recebê-lo aqui, no blog Autores S/A. Nesta semana, o tema proposto aos poetas concorrentes do concurso foi: O Sertão. Esta ideia foi concebida a partir de uma homenagem ao escritor Euclides da Cunha, autor do livro “Os Sertões”. O que esta obra proporcionou a você (reações, aprendizados, trabalhos...), e o que ela representa, na sua opinião, no cenário literário do nosso país?
Nonato: Parabéns ao blog pela escolha do tema e do autor. É um prazer falar deste livro de Euclides da Cunha, um marco na Literatura Brasileira. O texto de “Os Sertões” rompe. Há nele uma ruptura de gêneros literários e a construção de uma outra forma estética que se situa entre o ensaio e o romance. Além disso, Euclides introduz a interdisciplinaridade entre artes e ciências, possibilitando uma infinidade de leituras ideológicas, formalistas, psicanalíticas...
Essas rupturas e os demais procedimentos estéticos dos quais Euclides faz uso nOs Sertões, dizem muito da violência social que o seu texto encerra. Com medo dessa violência, adiei durante anos a leitura do livro. Li o “Grande Sertão: veredas”, de Rosa, releitura assumida de Euclides, e atravessei sertões de Graciliano, José Lins, Cascudo e Cabral, mas sempre adiando solos e desertos de Euclides. Até que, atentando para a identidade do Brasil e suas contradições, deparei com a sua dimensão paradisíaca e violeta. Dimensão essa que Euclides traduziu muito bem neste livro híbrido e viril que traumatiza e vinga. Depois dele, a literatura deixou de ser “o sorriso da sociedade”.
Lohan: Em seu ótimo texto, “Overdose do real”, encontrado no blog Arquivo de Formas (http://arquivodeformas.blogspot.com/), você afirma que "o perfil literário contemporâneo surge em sintonia com os gráficos da mídia e do mercado, mas de ouvido aberto ao discurso da crítica". Seria possível um autor posicionar-se de modo a atender tanto aos estímulos mercadológicos quanto aos oriundos da crítica especializada? Qual autor você apontaria, hoje, com um perfil exemplar condizente com sua visão de autor contemporâneo?
Nonato: Esse perfil condiz com a maioria dos autores contemporâneos publicados pelas principais editoras. Autores que frequentam as bienais e os mega eventos, a fim não apenas de autografar e comercializar os seus livros, mas principalmente de contatar o leitor – o grande personagem desta história.
Lohan: De acordo com sua experiência profissional e de vida, o que mais importa, em um certame como este: o autor, a sua obra ou o leitor/jurado? Na sua opinião, o leitor/jurado deve valorizar a trajetória do autor-competidor ou uma análise isolada de seus poemas seria mais justa?
Nonato: Sabemos que, desde a produção das vanguardas e a construção das poéticas modernas, no início do século XX, o autor perdeu muito da sua onipotência. Sabemos também que, a partir deste contexto estético e histórico da modernidade, o papel do leitor e a produção da obra ganharam leituras infindas e criaram procedimentos inusitados. Neste sentido, sou borgiano e prezo muito por uma poética da leitura. Para Borges, importavam muito mais as páginas lidas do que as páginas que ele escrevia. Na verdade, essa poética da leitura consiste numa descarada declaração de amor às formas herdadas da tradição literária. Por isso, um poeta contemporâneo como Paulo Leminski pergunta no seu belo “Catatau”: Não somos os ossos da tradição?
Lohan: Nonato, pra terminar, qual conselho você deixa aos poetas dessa competição em relação a esta temática, O Sertão? Você poderia dar alguma sugestão de leitura?
Nonato: Gosto muito desta temática do sertão. Não chega a ser um conselho, mas uma sugestão. Sugiro aos poetas a releitura de autores da tradição modernista que possuem o sertão como tema: Euclides da Cunha, Graciliano Ramos, João Cabral, Guimarães Rosa, Ariano Suassuna, Antônio Torres... No link abaixo encontra-se um texto nosso, sobre o tema do sertão, que acaba de sair na revista da Uniabeu: http://arquivodeformas.blogspot.com/2011/06/os-sertoes-e-alguma-coisa-do.html
Entrevista com: Paulo Fodra
Paulo nasceu e vive em São Paulo. Formou-se arquiteto, mas trabalha com marketing e branding. É também músico, membro da banda Chevy 69, arqueiro e leitor compulsivo. Viciado na agitação da metrópole, escreve para se livrar das vozes que moram em sua cabeça. Participou da coletânea steampunk “Deus Ex Machina – Anjos e Demônios na Era do Vapor” (Editora Estronho, 2011), com o conto “A Seita do Ferrabraz”. Seu livro de microcontos “Insólito” – microalucinações (Selo 3x4, Editora Multifoco), foi lançado em 2011. Mantém o twitter @paulofodra e divulga seus contos fantásticos no site www.paulofodra.com.br.
Lohan: Olá, Paulo, primeiramente, é um prazer recebê-lo aqui no Autores S/A. Escritor, blogueiro, arquiteto, músico, arqueiro, trabalha com Marketing... Quantas especialidades o compõem! Quais as semelhanças que você pode identificar entre ser um arquiteto com o ser um escritor?
Paulo: O ofício do arquiteto, mais do que desenhar e construir, é organizar o espaço. É materializar uns sonhos e desejos. É se conectar às pessoas e provocar emoções. Escrever também é mais do que juntar palavras. É construir uma imagem dentro da cabeça de outra pessoa. Essa imagem, assim como a arquitetura, precisa de planejamento e técnica para a execução. Só que esses dois fatores, sozinhos, não têm a capacidade de emocionar um indivíduo. É uma equação delicada e deliciosa de se equilibrar.
Lohan: Em seu perfil na rede virtual, você diz que ''escreve para se livrar das vozes que moram em sua cabeça''. Desde quando você ''ouve'' essas vozes, Paulo? Quando se descobriu escritor, e como?
Paulo: A mesmice sempre me inquietou. Nunca me conformei com a rotina enquanto pano de fundo para a vida. Viver é sentir, experimentar. Por isso, sempre imaginei novas formas de fazer velhas coisas. Nunca me contentei, por exemplo, em escrever uma redação "Minhas férias" como as que os meus colegas liam, ano após ano, na escola. Não queria dizer o que todo mundo dizia, pois sentia que havia mais a ser dito. Nunca me contentava com uma explicação superficial. Escrever foi o modo que encontrei de canalizar a minha visão pessoal do modo como as coisas são, para compartilhá-la com outras pessoas.
Lohan: Paulo, você é blogueiro, e também já participou de uma antologia. Os melhores poemas deste concurso formarão uma antologia, que será publicada pela editora Multifoco. Você, que está imerso nesta realidade dos blogs, acredita que pode nascer daqui, deste concurso realizado no Autores S/A, um grande nome da literatura?
Paulo: Atualmente, tenho visto muitos talentos à deriva. A maior dificuldade continua sendo ser ouvido pelo público certo. Nesse processo, conta muito o empenho pessoal do autor, os projetos encampados por blogs como o Autores S/A. Vamos torcer!
Lohan: Pra finalizar, qual é o conselho que você deixa aos poetas competidores, Paulo? Na sua opinião, qual será o perfil do poeta vitorioso neste certame?
Paulo: O grande conselho que eu dou para quem está no concurso, ou mesmo procurando sua trilha pela escrita, é insistir até encontrar uma voz própria. Ou várias. O que não se pode, nem se deve fazer, é ignorá-las ou sufocá-las pensando no lado comercial. Tapinhas nas costas são bons de vez em quando, mas ser porta-vozes é uma imensa e solitária responsabilidade. Ir contra isso não vale a pena.
Entrevista com: Ana Elisa Ribeiro
Nascida e residente em Belo Horizonte, 35 anos. Doutora em Linguística e pós-doutora em Comunicação. Professora do Centro Federal de Educação Tecnológica de Minas Gerais (CEFET-MG). Publicou os livros de poemas "Poesinha" (Poesia Orbital, 1997), "Perversa" (Ciência do Acidente, 2002) e "Fresta por onde olhar" (InterDitado, 2008), além de poemas e contos em coletâneas no Brasil e em Portugal. É colunista do Digestivo Cultural (www.digestivocultural.com) desde 2003. No Twitter, é @anadigital.
Lohan: Olá, Ana Elisa. É um enorme prazer recebê-la no blog Autores S/A. Ana, você já escreveu algum poema ou texto de outro gênero em homenagem a um autor(a) de sua preferência? Aliás, qual é o seu autor(a) favorito, Ana Elisa?
Ana Elisa: O prazer é meu. Não sei se tenho um autor favorito, mas tem uns caras que mudaram meu modo de ver a literatura e o mundo. O primeiro que me vem à cabeça é o Paulo Leminski, o kamiquase curitibano. Outro é o Fernando Pessoa, o múltiplo português e todos os seus diversos, especialmente o Álvaro de Campos. O Guimarães Rosa, nosso mineirão aqui, não pode deixar de ser citado. Escrevi sim poemas inspirados em alguns poetas aí. O mais evidente é um poema que refiz ou recriei com base na Cantiga da Ribeirinha, do Paio Soares Taveirós, autor medieval do que é considerado o primeiro texto escrito em língua portuguesa. É uma espécie de tradução. Há outros. Acho que fiz coisas inspirada no Leminski. Mas fiz outras, inspirada em poemas de poetas que não curto muito também. Uma espécie de "melhoria".
Lohan: Tomando como suporte um dos títulos de seus textos publicados no site Digestivo Cultural (http://www.digestivocultural.com/), o ''É possível conquistar alguém pela escrita?'', faço-lhe a seguinte pergunta: enquanto poeta, como conquistar o seu leitor? Existe algum artifício em especial, ou basta exprimir a sua verdade?
Ana Elisa: Não sei se existe artifício. Os leitores são vários, então você fisga uns e não fisga outros. Não há como saber. O escritor universal não existe, né. O que eu vejo é que os temas pegam leitores, mas o texto fácil, ágil, rápido também pega. Escrever sobre sexo, por exemplo, é batata. Mas texto bom é bacana também. Eu tento escrever com espontaneidade e meu jeito é esse, é ágil. Não pensei em técnicas para isso. Já o texto do Digestivo... Bem, é aquilo. A escrita pode funcionar como canto de sereia. Há pessoas que se apaixonam pelo eu lírico ou pelo narrador. É possível conquistar alguém por e-mail, por exemplo. Ou pelas colunas do site. Já aconteceu comigo.
                                                                                                               
Lohan: De acordo com sua experiência como professora e poeta, qual conselho e/ou sugestão você dirige a todos os poetas desta competição? Qual o caminho você aponta para um poeta sagrar-se querido tanto entre os jurados como entre o público-leitor e, dessa forma, poder vir a ser o vencedor do concurso?
Ana Elisa: Difícil dar conselhos ou recomendações. Poesia se faz testando, escrevendo, ganhando intimidades com a língua, deixando a expressão vir. Poesia é um parafuso solto. Eu sugiro não forçar a barra e não querer se parecer com alguém.
Entrevista com: Victor Paes
Victor é escritor, ator, editor da revista e da editora Confraria do Vento. Publicou em 2007 o livro de poesia “O óbvio dos sábios” e em 2010 o livro “Mas para todos os efeitos nada disso aconteceu”, pelo projeto Dulcineia Catadora. Foi publicado pela editora Record, no prêmio “Nossa Gente, Nossas Letras”, e recebeu o prêmio Jovem Artista, da Rioarte, por texto teatral encenado no Projeto Nova Dramaturgia, no teatro Carlos Gomes. Tem publicados seus textos em revistas e sites como “Cronópios”, “Germina”, “Polichinello”, “Celuzlose”, “Babel”, entre outros. É um dos 21 poetas da coletânea “XXI Poetas de hoje em dia(nte)”, organizada por Priscila Lopes e Aline Gallina, pela editora Letras Contemporâneas. Escreve também para teatro e já teve montadas algumas de suas peças, dentre elas “Mara em um quarto”, “As três Marias”, e “Os cálices do deus”. Publica o blog http://victorpaes.blogspot.com.
Lohan: Olá, Victor Paes. Primeiramente, é um grande prazer recebê-lo aqui no Autores S/A. No livro "O que é poesia?", no qual você está presente como um dos poetas que concederam sua opinião a respeito da poesia, você diz que o mecanismo poético é arrebatador e indomável. A técnica excessiva, na construção poética, não seria a tentativa (vã?) de domar as palavras, estruturá-las de modo que se encaixem perfeitamente umas às outras? Quem arrebata o leitor? O poeta, com sua genialidade, ou a própria poesia (as indomáveis palavras)?
Victor: O prazer foi todo meu. Bem, quando falo de mecanismo, estou englobando tudo aquilo que faz um poema ser arrebatador, antes mesmo de ser criado. E há muita coisa envolvida aí, desde o que chamamos de “genialidade” do poeta, que nada mais é que uma disponibilidade quase doentia para o arrebatamento (que muitos poetas forjam que têm, mas não têm), passando pela técnica (ou até, muitas vezes, pela falta dela) e por diversos outros fatores, até mesmo os olhos e ouvidos do leitor. Dar mais ou menos valor à técnica é dar mais ou menos atenção a um desses fatores, tão essencial quanto os outros. Agora, tentar domar as palavras é tão vão quanto tentar domar a vida.
Lohan: O seu livro se chama ''O óbvio dos sábios". Conte-nos um pouco sobre este seu trabalho e o porquê deste título. O que seria o óbvio para os sábios, caro Victor?
Victor: Esse foi meu primeiro livro, publicado em 2007 (com poemas que já vinha escrevendo há alguns anos). O título é uma ironia com aquilo que parece que todos sabem, mas que só os sábios é que acabam “sabendo”. Discutimos muito, falamos sobre tudo, mas quando alguém aparece com alguma solução para algo, geralmente é a mais óbvia. E minha ideia foi jogar isso no palco (o livro é em forma de diálogos), botar no fogo essa nossa gana por sermos complexos... Essa gana da qual somos incapazes de fugir...
Lohan: Solicitamos aos poetas competidores, nesta rodada, que escrevessem sobre o seguinte tema: Pai - Uma homenagem. O dia dos pais se aproxima. Victor, como é ou como foi a sua relação com seu pai? Você poderia nos dizer algum momento marcante já vivenciado com seu pai, aproveitando o ensejo da data?
Victor: Nossa, escolher um momento é muito difícil... Quando somos crianças, tudo que vem dos pais é tão marcante, que acabamos guardando muita coisa... Enfim, tem uma lembrança que me vêm à cabeça sempre: era um dia de domingo normal, de um frio normal, de um leite sendo fervido normalmente por ele no fogão e eu estava sentado, de meias, esperando com ele... Vira e mexe tenho esse flash. Nunca me perguntei por quê. E também nem quero me perguntar. Só sei que é um belo quadro... De que gosto de me lembrar...
Entrevista com: Tânia Tiburzio
Tânia é mineira. Está morando em SP há 4 anos, tem 32 anos, é advogada, membro do conselho editorial da Mundo Mundano (www.mundomundano.com.br). Administra o blog: http://diariodett.blogspot.com/
Lohan: Olá, Tânia! Primeiramente, é um prazer recebê-la aqui no Autores S/A. Além de escritora, você também é advogada. Quais são os pontos de intersecção que você pode encontrar entre esses dois, digamos, ramos na sua vida?

Tânia: Obrigada ao Autores S/A pela oportunidade. Fiquei muito honrada com o convite. Bem, inicialmente não me considero uma escritora, costumo dizer que só “brinco” com as palavras já que elas não me deixam outra saída. Quanto à sua pergunta penso que Direito e Literatura só se aperfeiçoam com o bom uso da palavra e esse é o ponto comum. No Direito, uma palavra usada de maneira equivocada pode colocar tudo a perder, uma lei ou sentença mal redigida pode levar a uma injustiça. Ser preciso, lapidar bem as frases, escolher a melhor palavra e a melhor hora para usá-la são características necessárias tanto ao operador do Direito quanto ao escritor. O bom profissional do Direito ama as palavras e é com elas que se alimenta e vive, tal como um escritor. Não é por acaso que temos tantos advogados, juízes e promotores ligados à literatura, sejam como escritores ou simplesmente como bons leitores, críticos e exigentes. O próprio Mundo Mundano, site basicamente de literatura do qual participo, foi criado por uma advogada e vários são os colaboradores que também labutam no Direito.
Lohan: Tânia, você é um dos membros e administradoras do site Mundo Mundano (http://mundomundano.com.br/v1/index.php). Você acredita que a Internet é um bom meio para divulgar o trabalho poético? Como você enxerga essa realidade poética-virtual?
Tânia: Eu acho que não dá mais para pensar em poesia sem pensar em Internet. A poesia aqui se espalha de uma forma incrível. A reposta do leitor é muito rápida e isso gera uma satisfação incrível para o escritor. Afinal, todo mundo escreve para ser lido, não é mesmo? No mais, muitas pessoas que vejo lançando livros começaram por meio de blogs ou em sites como o Mundo Mundano.
Lohan: Solicitamos aos poetas competidores, nesta rodada, que escrevessem sobre o seguinte tema: Pai - Uma homenagem. O dia dos pais se aproxima. Tânia, como é ou como foi a sua relação com seu pai? Você poderia nos dizer algum momento marcante já vivenciado com seu pai, aproveitando o ensejo da data?
Tânia: Lohan, se estou aqui hoje entre tantos artistas devo isso ao meu pai, um homem apaixonado por literatura. Foi com ele que adquiri o hábito da leitura, o gosto pela poesia. Meu pai conhece tudo, tem opinião formada sobre tudo e sou sua grande fã. Apesar de engenheiro e matemático sempre foi muito ligado às ciências humanas e isso o faz ter uma visão de mundo muito especial. O mais engraçado que fui proibida de dar livros a ele pela minha mãe, porque ele se apega aos livros e a deixa sozinha.
Entrevista com: Manuel Antônio de Castro
Manuel nasceu em março de 1941, em Portugal. Em 1952 emigrou para o Brasil. Em Minas Gerais - cursou ensino médio com os frades franciscanos. De 1962 a 1964 fez o curso de filosofia no Rio Grande do Sul, tendo como professor Dom Cláudio Hummes. Sai do convento e em 1965 cursa durante um ano Sociologia na UFRJ (antiga FNFi). Sai e faz o curso português-francês, terminado em 1969. Convidado pelo prof. Eduardo Portella, torna-se professor da UFRJ em 1970. De 1971 a 1973 faz o Mestrado e se torna Mestre, com a Dissertação: O homem provisório no grande ser-tão. Uma leitura de Grande Sertão: veredas. Em 1976 faz concurso para Assistente na UFRJ. Em 1975 inicia o doutorado e com a tese O acontecer Poético - a história literária, obtém o título de Doutor em Letras. Por concurso, em 1998, se torna Titular de Poética, dando continuidade à sua travessia. Suas pesquisas e publicações desenvolvem uma Poética da Poiesis, voltada para a integração de Pensamento e Poesia. Leciona nos Cursos de Pós-Graduação e orienta Dissertações de Mestrado e Teses de Doutorado no Programa de Ciência da Literatura, na Área de Poética, da Faculdade de Letras da UFRJ. É autor de um dicionário digital de POÉTICA E PENSAMENTO, cujo endereço é: www.dicpoetica.letras.ufrj.br . Fez 70 anos agora e por isso está aposentado da Universidade, mas neste semestre está dando um curso na pós: A história do sentido da arte. É às 5as. feiras no horário de 10:30 às 13:00. Há os alunos inscritos oficialmente e os que são ouvintes. Se alguém quiser participar sinta-se convidado. Neste semestre estão sendo publicados dois livros com ensaios em sua homenagem: um de professores amigos e outro de ex-alunos. Além disso, publicará um livro de ensaios: “Arte: o humano e o destino”. Administra o blog http://www.travessiapoetica.blogspot.com/
Lohan: Olá, Manuel. É um prazer imenso recebê-lo aqui no Autores S/A. Você é autor da tese de Doutorado ''o acontecer Poético - a história literária''. Manuel, afinal, o que é o acontecer poético, na sua concepção?
Manuel: O sub-título é: A história literária. De uma maneira geral, o que se ensina como história da literatura é muito dispersivo e fraco, pois fala-se de tudo, só as obras não falam. E sem a fala das obras não há poesia, não há obra de arte. Então, nesse sentido, a história literária tem de ser diferente da mera historiografia, porque o centro tem de estar nas obras. São elas que fazem a história. Mas então ela será um acontecer. Todo acontecer é a eclosão do sentido histórico e ontológico do ser humano na realidade. Sendo ontológico, é poético. Portanto: acontecer poético. É o que chamo de onto-lógico. Onto diz o próprio de cada um, pois cada um diz: "eu sou". Não é o "eu" que faz o "sou", mas este é que possibilita o que cada um é enquanto um "eu". O próprio são as propriedades ou possibilidades de chegar a ser o que já desde sempre cada um é. Realizar essas possibilidades é a nossa tarefa poética. Todos somos potencialmente poetas. Já o lógico vem do verbo grego legein, de onde se originou, via latim: legere, o nosso ler. E o que quer dizer? Por, ocupar uma posição no silencio. Essa posição do e no silêncio permite a fala, por isso o seu segundo sentido é reunir e o terceiro é dizer. Dizer é proclamar a reunião e ordem, sentido do que se põe, das diferentes posições em que a realidade se manifesta. Mas os três vigoram na unidade da linguagem. A linguagem é o sentido do ser. Portanto, ontológico é advir ao sentido do que se é enquanto próprio. A linguagem (vigorar do dizer) enquanto sentido é o poético. Daí o título: Acontecer poético.
Lohan: Manuel, você elaborou um belo trabalho virtual, que é o dicionário digital de Poética e Pensamento, cujo endereço é (www.dicpoetica.letras.ufrj.br). Como surgiu a ideia desse trabalho? E como ele é elaborado por você, existe alguma metodologia?
Manuel: A ideia é muito antiga, comecei em 1984 fazendo fichas com passagens importantes de grandes autores. Fui acumulando fichas. Na década de 90 surgiu a oportunidade de usar o computador para publicar textos. Então um dia notei que poderia passar as fichas para um computador e fazer um dicionário virtual, digital. O difícil era o programa. Um dia, conhecendo a WIKIPEDIA, me informei e me disseram que o programa era gratuito. Consegui o programa e o tutorial e um aluno da graduação da UFRJ se propôs a estudar o tutorial. Um grupo de alunos e monitores foram digitando as fichas. E assim surgiu o dicionário. Porém, ele é diferente dos dicionários existentes, como é explicado logo na primeira página. Acho que a inovação principal está em duas facetas: não é semântico, não se guia por uma hierarquia ou sequência de significados; por isso pode crescer indefinidamente. É o que está acontecendo. A qualquer hora e dia posso incluir novos verbetes e novas fichas em cada verbete. Ainda ontem à noite incluí duas sobre caos. É só conferir. Eu não abri para que qualquer pessoa possa incluir verbetes ou fichas para conservar uma certa unidade ou linha de pensamento criativo, poético. Sugestões podem ser mandadas que, depois de examinadas, serão incluídas ou não.
Lohan: Pra terminar, deixe, por favor, uma mensagem aos 3 poetas semifinalistas deste certame, que foi tão disputado até aqui.
Manuel: No filme de Wim Wenders, “Tão Perto, tão longe”, o anjo e a anja, em determinado momento, dizem: Somos os mensageiros, não somos nada, não somos a mensagem. A mensagem é o Amor. E o que é então o Amor? É, diria para os poetas, que ele é a fonte de todo e qualquer poema. Mas como poético, o Amor é éros, a força irradiante e manifestadora de toda a realidade. Portanto, do que somos e não somos, de nosso próprio. Como poetas, deixem-se tomar pelo Amor que manifesta e faz acontecer a realidade, daquilo que é e daquilo que não é, daquilo que somos e não somos. Então os poemas serão o acontecer do sentido do que somos e falarão a partir do vigorar do silêncio, fonte de toda fala do sentido poético. Sem escuta do silêncio não há poesia, não se produzem poemas poéticos. É um desafio, mas que vale a pena.
Entrevista com: Flávia Rocha
Flávia nasceu em São Paulo em 1974. Jornalista, formada pela Fundação Cásper Líbero, trabalhou nas redações das revistas Casa Vogue, Carta Capital, República e Bravo!, e atualmente colabora com diversas publicações. É autora dos livros de poemas “Quarto Habitáveis” (Confraria do Vento, Rio de Janeiro), a ser lançado no final deste mês, e o bilíngue "A Casa Azul ao Meio-dia/ The Blue House Around Noon" (Travessa dos Editores, 2005). Tem mestrado (M.F.A.) em Criação Literária/Poesia pela Columbia University e é editora-chefe da revista literária americana Rattapallax, com sede em Nova York (www.rattapallax.org). Editou antologias de poesia brasileira para as revistas Rattapallax (EUA), Poetry Wales (País de Gales) e Papertiger (Austrália), entre outras. Fundou, com seu marido, Steven Richter, a Academia Internacional de Cinema (www.aicinema.com.br), escola de cinema localizada em São Paulo, onde, entre diversas atividades, desenvolveu um curso de Criação Literária. Morou em algumas cidades de que sente saudades: São Paulo, Niterói, Curitiba, Nova York, e hoje vive em Portland, Oregon, nos Estados Unidos.
Lohan: Olá, Flávia. É um prazer recebê-la aqui no Autores SA. Você fez Mestrado em Criação Literária. De acordo com sua experiência como pesquisadora da área, e como poeta, qual é o melhor caminho para a criação poética? Se não existe caminho, existe ao menos algum artifício técnico que seja fundamental para o poeta?

Flávia: Tem duas coisas que todo mundo que quer levar literatura a sério precisa fazer continuamente (e todo mundo já sabe): ler e escrever. Ler criticamente, escrever criticamente. A tendência de todo escritor é, naturalmente, gostar daquilo que escreveu -- mas nosso ego não costuma ser nosso melhor crítico. A melhor forma de nos protegermos do nosso ego é estudar e explorar o que existe no mundo lá fora. Escrever bem é um talento adquirido, uma arte — e como tal requere aplicação, habilidade, experimentação de seus meios e possibilidades estéticas, conceituais, formais. Há escritores que defendem o autodidatismo na literatura — o caminho mais “romântico” e isolado. Eu penso que a experiência literária é mais profunda quanto mais externizada. Sou a favor das oficinas literárias, da troca de ideias, das leituras, dos blogs, dos fóruns, do intercâmbio de textos, dos concursos, de experiências de laboratório como mecanismos de aprimoramento da escrita. As oficinas proporcionam tudo isso. Fornecem leituras enquanto processo. Indicam caminhos, alguns atalhos que talvez sozinho você não viesse a encontrar. E, claro, desconstroem o seu ego, no bom sentido.

Lohan: Flávia, você também lida com a área cinematográfica. Muitas pessoas dizem que preferem assistir o filme a ler o livro cujo filme foi baseado. Como você vê a transposição de obras literárias para as telas do cinema? Neste mundo onde o imagético reina, isso é favorável para a literatura?
Flávia: Um não elimina o outro, complementam-se. As adaptações para o cinema abrem as possibilidades de expressão de uma obra originalmente literária — destacam-se dela, para transformarem-se em outra coisa. A música desde sempre serve-se da literatura da mesma forma que o cinema serve-se da música e da literatura. Um desdobramento. Cada meio com suas especificidades e limitações. Tenho uma postura liberal, não conservadora, para com as artes, a vida em geral. Olho com curiosidade e entusiasmo para as transformações da linguagem, para as intervenções tecnológicas. O cinema se serve de muitas artes e linguagens, e a literatura é uma fonte inesgotável. Se você vai ver um filme esperando que corresponda exatamente ao livro de que a história foi adaptada — você vai certamente se desiludir. Pior ainda se você tentar fazer um filme que corresponda ao livro— já começou mal. As boas adaptações conhecem bem as vantagens e limitações da sua linguagem, e extraem o melhor delas. Favorável para a literatura? Eu diria, favorável para a obra, pois ganha novas matizes de expressão. Em termos de mercado, pode ajudar a vender livros, sim.
Lohan: Pra terminar, deixe uma mensagem aos poetas semifinalistas, cara Flávia, orientando-lhes em como ser um vitorioso com vossas poesias neste mundo onde se lê tão pouca poesia.
Flávia: Escrever poesia — quem escreve sabe — faz você se sentir vivo, vitorioso de alguma forma, mesmo que íntima e internizada. A poesia é o fim, em si mesma, e é só assim que ela acontece verdadeiramente. Depois, fora da poesia, há a fase social, em que o poema deixa de pertencer a você, cai no mundo — um mundo pequeno? -- não, o mundo da poesia é gigantesco, pois atravessa séculos. Tive um professor, o poeta americano Edward Hirsch, que diz sempre que o poeta não vive exclusivamente no seu tempo, sua vivência poética acontece ao longo de toda a história. Ler Drummond é estar com Drummond. O tempo se dissolve. E se formos pensar exclusivamente no mundo de hoje, também é enorme. São inúmeras revistas, blogs, sites, eventos de poesia acontecendo todos os dias mundo afora. E principalmente gente escrevendo poesia, em toda parte, no silêncio do papel (contemporaneizando a metáfora: no silêncio das telas de computador). Aos semifinalistas: é um prazer encontrar vocês por aqui!

Entrevista com: Marcelo Diniz
Marcelo é poeta, letrista, tradutor e professor do Departamento de Ciências da Literatura da Universidade Federal do Rio de Janeiro. Publicou “Trecho” (Aeroplano e Fundação Biblioteca Nacional, 2002) e “Cosmologia” (Sete Letras, 2004). Assina parcerias nos cd de Fred Martins.
Lohan: Caro Marcelo, é um prazer tê-lo aqui no Autores S/A como jurado convidado. Você é um dos melhores sonetistas contemporâneos brasileiros, segundo o poeta Roberto Bozzetti. Como você avalia a construção poética nos dias de hoje? O soneto ainda mantém seu fôlego em meio a tantas inovações poéticas ou vive-se a era da poesia rápida, sem qualquer métrica?
Marcelo: Primeiramente, sou grato pelo convite dessa entrevista. Grato também pela generosidade do julgamento sempre suspeito de um grande amigo como o Roberto Bozzetti. Particularmente, tenho minhas reservas quanto a esses adjetivos hiperbólicos como “um dos melhores”, que mais me parecem atender ao julgamento de atletas do que o da própria poesia. A construção poética de hoje é, como sempre foi, plural. A rapidez e ausência de medida são qualidades que me parecem superficiais a se observar nessa pluralidade. Um poema breve, aliás, o soneto é considerado uma forma breve, sempre exige uma temporalidade de recepção que poderíamos, com a mesma superficialidade, afirmar ser longa. Essa temporalidade da reflexão de um poema, a meu ver, é justamente o que se pretende imortal no poema, ou seja, sua a temporalidade. Se, de uma maneira um tanto generalizada, vivemos um tempo de diluição e rapidez, a arte me parece exigir de quem a faz e de quem frui certa paciência, a paciência de uma duração que nos faça leitores e autores de um universo de linguagem que pode se medir em séculos, e que exige certa cultura de leitura de fôlego, digamos, cetáceo, um pulmão de mamífero capaz de atravessar oceanos.
Lohan: Marcelo, nesta rodada, um dos temas é o ''amor''. O romântico ainda tem seu espaço na poesia hodierna? O amor continua sendo o tema mais universal e praticado que existe na poesia?
Marcelo: Creio que um fator fundamental da arte é justamente o da abolição da temporalidade linear e sucessiva que faça com que o passado encontre um lugar definitivo e clarificado na História (essa ficção de H maiúsculo). A arte não reconhece o passado como passado, ela se constitui na contemporaneidade de seu gesto. A relação da arte com o tempo é de ordem não sucessiva, ressuscitadora portanto, uma espécie de desfribilador constante das tradições e do que a temporalidade linear insiste em enterrar e esquecer. Nesse sentido, não vejo o que na arte não tenha mais lugar.
Lohan: Qual é a sua relação com a música, Marcelo? Você diria que letras musicais podem ser consideradas poemas?
Marcelo: Minha relação com a música se inicia com minha relação com os músicos. Meu ouvido foi iniciado no jazz pelos amigos de adolescência Fred Martins e Marcelo Martins. Minha educação musical é totalmente relacionada ao aprofundamento de minha amizade com Fred, meu parceiro quase absoluto em meu trabalho como letrista. Considero a música como a arte mais linfática de nossa cultura, aquela que se encontra presente mesmo quando não estamos atentos a ela. Isso que para muitos músicos e teóricos significa uma perda de prestígio e banalização, para minha modesta opinião de leigo em termos de música, é um poder, uma espécie de onipresença da música em nossas vidas. Não acho que todas as letras possam ser consideradas poemas. A letra é um texto cuja finalidade não é o próprio texto, é um texto que é parte de uma estrutura maior e que por vezes prescinde da própria letra. O poema, não: a finalidade do poema é o próprio poema, sua musicalidade é interna e autossuficiente. Essa diferença abstrata que considero aqui, no entanto, não abole o fato de que cada caso é um caso.
Lohan: Por fim, deixe uma mensagem aos poetas. Como ser um poeta vitorioso em seu ofício?
Marcelo: Ler. Ler para sempre. E, sobretudo, reescrever. Não há vitória nesse ofício. Há a alegria decerto, um afeto cuja finalidade se encontra nele mesmo.
Entrevista com: Tavinho Paes
Tavinho é compositor e produtor (indústria fonográfica). Escritor (peças teatrais, poemas, romances). Roteirista (cinema, televisão). Jornalista (serviços de informação); WebMaster & webDesigner. Artista plástico. Formado em Economia (PUC-RJ = 1973/1976) e Comunicação (PUC-RJ =1976/1977). Fundador da gravadora Indie Records e do CEP 20Mil. Compositor e Produtor Musical; webMaster HTML; Produtor Gráfico. Editor Literário; vídeoMaker Independente; Vendedor de Livros. Realizador Independente; Produtor Cooperativo; Diretor Intuitivo. Fundador do Cep 20.000, com Chacal, Carlos Emílio Lima e Guilherme Zarvos (1991). Tem mais de 250 registros gravados por artistas como: Caetano Veloso, Gilberto Gil, Maria Bethânia, Gal Costa, Marina Lima, Marisa Monte, Rita Lee, Lulu Santos, Lobão, Skank, Ney Matogrosso, etc... Compôs sucessos como: “Totalmente Demais”, “Linda Demais”, “Radio Blá”, “Sexy Yemanjah”, etc. Produziu trilhas musicais para filmes como “Navalha na Carne” e “Luzia Homem”, entre outros Colabora com jornais eletrônicos, tendo sido editor dos extintos Cult Link e PasquiNet.
Lohan: Olá, Tavinho Paes. É um imenso prazer recebê-lo aqui no Autores S/A. Poeta, jornalista, artista plástico, já compôs para vários artistas de renome (Lobão, Caetano Veloso, Marisa Monte, Rita Lee, Ney Matogrosso, Roupa Nova, etc.), posso considerá-lo um dos artistas mais versáteis do Brasil. Qual faceta artística lhe proporciona maior prazer? Uma se complementa à outra?
Tavinho: Todas se complementam, mas atuar falando, de improviso, em performance (prefiro palestra-show) ... Isso é demais!
Lohan: Como você vê a relação da Internet, hoje, com a poesia? Na sua opinião, quais são as vantagens e as desvantagens na disseminação da poesia neste veículo, a Internet? Você acredita que concursos de poesia virtuais, desse formato, são válidos?
Tavinho: A internet terá invariavelmente os dois lados da moeda sempre que você a girar. O mais positivo é a liberdade de informação que você tem. O negativo é que, mesmo podendo ser acessado por milhões de pessoas ao mesmo tempo, você só pode acessar uma pessoa de cada vez.
Lohan: Pra finalizar, que mensagem você deixa aos poetas que estão rumo a Grande Final deste concurso de poesia virtual?
Tavinho: O concurso é uma estrada que pode te levar a qualquer lugar, portanto, faça como Cristóvão Colombo, que saiu sem saber aonde ia e quando chegou não sabia onde estava... Ou seja: siga em frente, mesmo que seja necessário, de vez em quando, dar um passo atrás!
Entrevista com: Ângela Gomes
Ângela nasceu e mora em Curitiba. É formada em Musicoterapia, pela Faculdade de Artes do Paraná (FAP); Especialista em Fundamentos do Ensino da Arte (FAP); Mestranda do PPG Antropologia Social/ Arqueologia (UFPR). Escreveu a peça infantil “A bruxa louca da cabeça oca”, apresentada do mini-auditório do Teatro Guaíra (1986); com o poema “Mariposa” participou da “Primeira Mostra de Haicais de Curitiba”; poema “Labirinto” – Menção Honrosa no Concurso Helena Kolody (2003); autoria e récitas do “Cd Cádmio, poesia de transição”, com acompanhamento musical de Ricardo Pozzo e participação de Tullio Stefano (2006). Participou das antologias: “Poetas de Curitiba” (2003); “Pó&teias” (2006); “E-zine Bar do Escritor” (2007); “Bar do Escritor”, “Anarquia Brasileira de Letras” (2009); “Pó&teias, Poética” (2010). Tem poemas nos blogs: Pó&teias (poeteias.blogspot.com); Bar do Escritor (www.bardoescritor.net/blog) e Aedoscuritibanos (aedoscuritibanos.blogspot.com).
Lohan: Olá, Ângela! É um prazer recebê-la nesta final, no Autores S/A. Ângela, como você se descobriu escritora? Quais foram (e são) suas influências literárias?
Ângela: Ensaios escritos desde a pré-adolescência. Em torno dos 15, 16 anos passei a frequentar, na minha cidade, Curitiba, um espaço chamado “Feira do Poeta”, onde imprimiam poemas e faziam varais de poesia aos domingos, durante a Feira do Largo da Ordem. Às vezes havia palco para récitas, outras, rodas de poesia. Conheci muitos poetas nesse espaço. Muito enriqueceu minha vida. Promovido pela Fundação Cultural de Curitiba e a Feira do Poeta, participei da “Primeira Mostra de Haicais de Curitiba” em 1988, onde dezessete haicais foram selecionados e, entre eles, um meu. Foi uma sensação muito boa. Mas, passei a me reconhecer como poeta, verdadeiramente, após uma menção honrosa em um “Concurso Helena Kolody” em 2003. Eu sempre me vi poeta, mas, ser chamado poeta, pareceu ter novo significado. Não creio que sejam necessários títulos e louros para isso, pois, Poeta é um estado de espírito; não se é melhor ou pior por isso. Mas, esses olhares externos me fizeram olhar mais para dentro de mim e, tentar encontrar mais poesia. Minha primeira influência foi “A manhã é uma criança” de Joan Walsh Anglund, que ganhei com 9 anos de uma amiga dos meus pais. Depois, vieram Casimiro de Abreu, Cecília Meireles, Castro Alves, Olavo Bilac, Cruz e Sousa e, especialmente, Fernando Pessoa. Mas, minha grande paixão é Hermann Hesse.
Lohan: Qual mensagem você deixa aos poetas dessa Grande Final? Qual caminho (caso haja) um poeta deve trilhar para ter sucesso nessa carreira?
Ângela: Desejo muito sucesso a todos! Coragem para enfrentar o mundo e seus desafios! Desejo que ao olharem para dentro de si, se percebam pessoas muitíssimo especiais, pois, ser poeta é ter a sensibilidade à flor da alma. O caminho a seguir, se existe um, é o de encontrar-se com seus iguais. Os amigos, embora alguns a gente nem venha a conhecer pessoalmente, são as nossas referências. De alguma maneira os percebemos como iguais e, caminhar junto é sempre melhor que isolar-se, penso eu. E, ler e escrever para se inspirar e se exercitar.
Lohan: Pra terminar, Ângela, o que é poesia?
Ângela: Para mim a Poesia está em todas as coisas do mundo, do sagrado ao profano. Das coisas límpidas às indigestas, intragáveis e lúgubres. Sendo, a tradução desses estados de coisas o grande desafio dos poetas, que é o de resgatar a beleza que possa parecer estanque, singular ou intangível Mesmo não havendo essa pretensão, por certo, sua tradução se tornará bela, pois, ousou adentrar e descrever mundos; universos gigantescos ou ínfimos. A prática da poesia, eu vejo como uma catarse, uma transmutação do estado das coisas, pelo engenho de um poeta, através do desenho das palavras.
Entrevista com: Jorge Tufic
Jorge Tufic é um poeta e jornalista brasileiro. Tufic iniciou sua educação em sua cidade de origem, transferindo-se posteriormente para Manaus, onde concluiu os estudos. Em 1976, foi agraciado com o diploma "O poeta do ano", prêmio concedido pelo Sindicato dos Jornalistas Profissionais do Amazonas, em reconhecimento à sua vasta e intensa atividade literária. Tem seu nome inserido em várias antologias, entre as quais destacam-se "A Nova Poesia Brasileira", organizada em Portugal por Alberto da Costa e Silva, e "A novíssima Poesia Brasileira", que Walmir Ayala lançou na Livraria São José, no Rio de Janeiro, em 1965. É sócio-fundador da Academia Internacional Pré-Andina de Letras, com sede em Tabatinga, no estado do Amazonas. Fez várias conferências literárias e é membro efetivo de algumas entidades culturais, tais como: Clube da Madrugada, Academia Amazonense de Letras, União Brasileira de Escritores (Seção do Amazonas) e Conselho Estadual de Cultura. Pertenceu à equipe da página artística do Clube da Madrugada, "O Jornal" e do "Jornal da Cultura", da Fundação Cultura do Amazonas. Colabora em vários órgãos de imprensa, com especialidade no Suplemento Literário de Minas Gerais. Jorge Tufic é o autor da letra do Hino do Amazonas, contemplado que foi com o primeiro lugar em concurso nacional promovido pelo governo daquele estado.
Lohan: Olá, Jorge! É um prazer imenso recebê-la nesta final, no Autores S/A. Jorge, você já foi agraciado com o prêmio de poeta do ano, em 1976; está na antologia "A Nova poesia brasileira" e na "Novíssima poesia brasileira". Sem dúvida, você figura entre os grandes poetas do nosso país. Como tudo isso começou? Desde quando a poesia visita sua vida, e como essa 'relação' se desenvolveu; o processo do fazer poético, os prêmios conquistados...?
Jorge: Ora, como diz o grande Fernando Pessoa em sua “Mensagem”, ¨todo início é involuntário”. Acrescido da falta de estímulo ao bisonho neófito que fui, este início pode até ser o próprio final de uma vocação promissora. O fato é que, depois de amargar a incineração de meus primeiros manuscritos, retornei de mala e bagagem à lojinha de miudezas de meu velho pai, disposto a ser apenas um daqueles pobres comerciantes da periferia do Mercado ¨Adolpho Lisboa¨, em Manaus. Tempos corridos, surpreende-me um Fiscal da Prefeitura de nome Manoel Lacerda, com a oferta de um jornal literário do Rio de Janeiro, Letras & Artes, e ali estava um soneto de Cecília Meireles na última página. Fiquei maravilhado porque o mesmo já não tinha rimas, só métrica. Falei isso ao Manoel Lacerda, ao que ele, estendendo-me uma Parker
de ouro, falou: - Toma, Jorge, você também pode fazer um soneto, e ainda
assim, sem uma única rima, deve ser moleza. Para não ir mais longe, Lohan, eu fiz o soneto, com alguns pés quebrados, mas fiz. Levou-me esse herói desta saga à ¨Folha do Povo¨, em cuja página foi divulgado num sábado para mim festivo e glorioso. Numa visita que resolvi fazer ao jornal, convidou-me o Secretário Adauto Rocha, um bom paraibano, a ficar como repórter e aprendiz de redação. Assim também o fiz. Quando saí desse órgão de Francisco Rezende, que foi empastelado, fundei meu próprio jornal, ¨O Tempo¨, de pouca duração mas forte no combate político. E a Poesia, como ficou? Bem, deu-se minha estreia com ¨Varanda de Pássaros¨, quase junto com Ferreira Gullar. Antônio Olinto brindou essa estreia em sua coluna de ¨O Globo¨, Porta de Livraria. Daqui em diante começa uma história maior, quando percorri o Sul e o extremo Sul fazendo parte de uma caravana de poetas, a qual, depois, ajudara na fundação do Clube da Madrugada.
Lohan: Jorge, muitas pessoas não sabem, mas você é o autor do hino do Amazonas. Como se deu esse processo de criação? Houve algum concurso, havia alguma regra estabelecida? E se você tivesse a oportunidade de criar uma estrofe para um suposto novo hino brasileiro, um 'hino contemporâneo', por assim dizer, como seria essa estrofe?
Jorge: O Concurso para escolha da letra do Hino do Amazonas foi lançado em 1980. Foi um Concurso Nacional. Coube a mim o primeiro lugar de acordo com o julgamento do Conselho Estadual de Cultura. Não havia tempo para concurso da música, já que o lançamento desse símbolo do estado estava marcado para 5 de setembro. Maestro Cláudio Santono foi convidado pelo Governador José Lindoso,
e fez a música. Um recorde. Não tenho ideia de como eu faria para mudar a letra do Hino Nacional. Acho que ele já mudou o bastante na execução musical, ficou melhor.
Lohan: Qual mensagem você deixa aos poetas dessa Grande Final? Qual caminho (caso haja) um poeta deve trilhar para ter sucesso nessa carreira?
Jorge: Aos jovens que se encantaram com a palavra poética, só tenho a dizer que leiam mais e escrevam menos.
Lohan: Pra terminar, Jorge, o que é poesia?
Jorge: Definir poesia também coube a mim fazê-lo no livro “Curso de Arte Poética¨, prêmio nacional de ensaio da Academia Mineira de Letras. Sugiro que o leia.
Entrevista com: Izacyl Guimarães Ferreira
            Nasceu no Rio de Janeiro, em 1930. Formado em Direito, pela UERJ; Letras, pela UFRJ; Biblioteconomia, pela Biblioteca Nacional; e Marketing, pela New York University. Escreve, traduz e comenta poesia. Editor da revista LB Literatura Brasileira, parceria do PEN Clube com a Scortecci Editora. Trabalhou na Direção de marketing, Rede Globo de Televisão de 1977-1980. Trabalhou na Criação e Superintendência da Globo Vídeo, 1981-1983. De 2002 a 2009 foi Presidente do Conselho Consultivo e Fiscal da União Brasileira de Escritores (UBE), editor da revista “O Escritor”, onde assinava a seção “Leitura de poesia”, e do Portal “O Jornal da UBE”, www.ube.org.br. Finalista do Prêmio Jabuti em 1998, na categoria poesia. Recebeu o Prêmio ABL de Poesia, em 2008.
Lohan: Olá, Izacyl! É um prazer imenso recebê-la nesta final, no Autores S/A. Em 2007, você foi premiado, com o livro "Discurso urbano", pela Academia Brasileira de Letras como o melhor livro de poesia do ano, por unanimidade, recebendo o prestigioso "Prêmio ABL de Poesia" em julho de 2008. Qual é a sensação de ser premiado pela ABL? Teria sido este o auge de sua carreira como escritor?
Izacyl: A sensação de ser premiado é ótima. E pela ABL, maior ainda o prazer. Fui premiado logo já na estreia, em 1953, com o Hipocampo, prêmio pra inéditos em livro, fechando as Edições Hipocampo, de Geir Campos e Thiago de Melo. Desde então recebi umas menções honrosas, em 71 num concurso da Secretaria de Cultura do Estado de São Paulo, prêmio "Governador do Estado de SP”. Depois num Jabuti da Cãmara Brasileira do livro e logo após no internacional "Casa de las Américas", de Cuba. Não penso em "auge". Prêmio é bom mas não é essencial. Só me inscrevi empurrado por amigos, nas três menções. O prêmio da estreia também, por insistência de meu professor na FNF, José Carlos Lisboa. O da Academia não tem inscrição. Foi surpresa e soube por telefonema de Lêdo Ivo.
Lohan: Você também atua como crítico e participa de diversas bancas de jurados. Embasado nessa sua experiência, qual seria a maior dificuldade de julgar um trabalho literário? A subjetividade atrapalha a prevalência da análise técnica?
Izacyl: Julgar é sempre difícil. E errar é comum. André Gide não quis publicar Proust... Fernando Pessoa perdeu "Mensagem" para um anônimo já esquecido... Se gosto - porque me comove ou me impressiona - releio e depois comparo com os outros concorrentes. E decido. Se em comissão, ouço os outros membros antes de decidirmos em comum acordo.
Lohan: Izacyl, é verdade que você foi aluno de Manuel Bandeira? Conte-nos um pouco sobre essa experiência e o que ela representou para você como pessoa e profissional das palavras.
Izacyl: Ter ouvido MB, ter conversado com ele, fantástico. Devia ter ouvido mais, conversado mais, aprendido mais. Mas era um jovem tímido e me assustei. Conto a experiência num poema que você lê na minha Antologia, "Lembrança do mestre". Num par de críticos leio que eu soube capturar alguma coisa do jeito dele.
Lohan: Qual mensagem você deixa aos poetas dessa Grande Final? Qual caminho (caso haja) um poeta deve trilhar para ter sucesso nessa carreira?
Izacyl: Não sei. Nunca persegui sucesso, sempre fui discreto, pouco lido. Quem merece acaba sendo descoberto...
Lohan: Pra terminar, Izacyl, o que é poesia?
Izacyl: Nunca soube responder isso. Ou se escreve muito e se dá exemplos ou se tenta chegar perto de uma resposta satisfatória. "...o que se faz com palavras", disse Mallarmé a Degas, "é um "não sei quê"; disse Bécquer, teóricos gastam toneladas de papel tentando explicar etc etc. Como toda arte - pintura, música, etc - o receptor educado reconhece ao contato. Mexe com a pele, o coração se mexe, o leitor se arrepia etc. Outro poeta disse que é como Deus, ou o amor. Não se nomeia mas se sabe o que é e, sobretudo, digo eu, o que não é poesia... "Emoção recolhida em tranquilidade", foi dito por Tenyson, se não me engano. Pound: "Literatura é linguagem carregada de significado" . Daí pode-se dizer, talvez, que Pound acharia que poesia seria isso em grau máximo. Octavio Paz escreveu centenas de páginas sem chefiar a um verbete. Não pretendo resolver o impasse.



Entrevista com: Roberto Bozzetti





Sou Roberto Bozzetti, carioca nascido em 1956, moro em Mendes, interior do Estado do Rio. Sou professor de Teoria da Literatura na UFRural RJ, em Seropédica. Lá também desenvolvo a linha de pesquisa "Poesia literária e poética da criação", refletindo sobre as questões que aproximam e/ou distanciam essas duas práticas de criação. Meu mestrado e meu doutorado foram dedicados ao tema. A minha tese de doutorado, que defendi em 2006, inclusive, foi sobre Paulinho da Viola. Um dos projetos é retomá-la, depurá-la, publicá-la em livro (havia um projeto que começou a se desenhar em 2008, inclusive com proposta de uma boa editora, mas acabou não indo à frente). Publiquei há pouco meus dois livros de poesia: “A tal chama o tal fogo”, que saiu no começo de 2008, e “Firma irreconhecível”, que saiu no começo de 2010 (embora o ano de edição seja 2009, foi lançado mesmo no começo do ano seguinte). Ambos foram publicados pela editora carioca Oficina Raquel, o que me honra muito, pois é uma editora corajosa, que tem se destacado no lançamento de significativos poetas estreantes (não que eu queira me incluir), inclusive autores portugueses até então desconhecidos no Brasil e que vão repercutindo aos poucos, devido a alta qualidade de sua produção, como é o caso de valter hugo mãe, atração da última FLIP. Além disso, a feitura artesanal dos livros lhes confere um charme todo especial.
Os dois livros saí­ram num perí­odo de tempo curto entre um e outro porque o primeiro reunia na verdade poemas escritos nos anos 80, um projeto de livro que tinha sido na verdade abandonado por mim. Os poemas chegaram ao Ricardo Pinto de Souza, editor da Oficina Raquel, principalmente pela insistência de Marcelo Diniz, amigo e poeta que muito admiro. A partir daí­, Ricardo "adotou" o livro e resolveu fazê-lo. Já o segundo livro foi motivado, sobretudo, pelo fato de eu me ver novamente motivado para o trabalho político com o envolvimento que acabei tendo para que o primeiro saísse (rever os poemas antigos, eliminar os que já não me agradavam nada, dar pequenos retoques em um e outro, etc.) O Ricardo gostou também dos poemas que juntei no Firma irreconhecível e resolveu editar também este. No momento pretendo, no plano acadêmico, solidificar as pesquisas envolvendo a criação poética literária propriamente dita e cancional; no plano da criação, vou tocando o blog que ativei há mais ou menos um ano, o "Firma irreconhecí­vel" (http://robertobozzetti.blogspot.com). Ali publico os poemas que vou escrevendo, os poemas de outros poetas de que gosto, umas crônicas, posto canções que amo e que comento, escrevo sobre futebol às vezes... Enfim, vou me divertindo. E penso que a receptividade tem sido bem legal, com alguns leitores fiéis. Mas poderia melhorar: os leitores comentam pouco no blog, preferem vir falar comigo pessoalmente. Isso tem um lado legal, mas faz com que a discussão no blog ande pouco. Assim, vou "experimentando força", que nem Macunaí­ma, até resolver partir pra comer cobra pra valer e encarar de frente um novo livro. Mas não tenho pressa nenhuma disso não. Aliás, ando pensando, para um futuro livro, fazer um trabalho conjunto com o desenhista e pintor mineiro Paulo Sergio Talarico. Propus isso a ele, que gostou da ideia, e aos poucos vamos nos movimentando. E por fim, acho que vou voltar a fazer letra de canção: tenho algumas parcerias com Fred Martins, outras mais antigas com Paulinho Lemos. São dois compositores ótimos, amigos meus, que atualmente moram na Espanha. Foi uma coincidência engraçada estarem os dois lá (eles se conheceram em brevemente e por meu intermédio), um ao Norte e outro ao Sul. Andei convencido durante algum tempo de que não fazia bem letra de canção, mas estou retomando aos poucos. Mandei uma letra pro Paulinho, vamos ver.


Lohan: Olá, Roberto! É um prazer imenso recebê-la nesta final, no Autores S/A. Você já publicou dois livros de poesia, sendo um deles, o "Firma Irreconhecível". Afinal, Roberto, o que é essa firma que não se reconhece?


Roberto Bozzetti: Se você faz questão do “afinal” que puxa sua pergunta... Um poema é afinal sempre e tão-somente ele mesmo. Ai só lendo o poema, talvez ajude ouvi-lo também (porque é muito longo), já que lancei um CD só com ele junto com o livro e o estou postando aos poucos no meu blog. Ele é afinal, como todo poema, o que nele está escrito.


Lohan: Roberto, quais foram e quais são suas referências e influências literárias? Qual sugestão literária você pode deixar para os poetas desta competição?


Roberto Bozzetti: As referências literárias são inúmeras, vou citar sem preocupação consciente de nenhum tipo de ordenação: Kafka, Machado, Mann, Flaubert, Dostoievski, Graciliano, Jane Austen, Mallarmé, Baudelaire, Gregório, Drummond, Bandeira, Oswald, Lorca, Cabral, Vinícius, Cesário Verde, Augusto dos Anjos, os concretistas, Rubem Braga, Paulo Mendes Campos... Muita gente mesmo, sei lá quem, quantos mais. Quanto a influências, devem estar aí entre essas referências, não é?, ou talvez ainda mais precisamente entre aqueles que foram importantes numa determinada fase de formação de leitor e (pretenso) poeta e hoje talvez não sejam tanto. Mas me acho muito incompetente pra honrar minhas influências. Agora, além disso, as influências vêm também daquilo que é além do que é literário: vêm do cinema, vêm das artes plásticas, vêm da música, vêm de outros campos da produção de conhecimento. Acho importante ressaltar isso, as referências (talvez influências) extra-literárias: Degas, Bosch, Caravaggio, Chagall, Van Gogh, os cartunistas, Fellini, Antonioni, Monicelli, Truffaut, Gláuber, Bressane, Arcand, Tarkóvski, Altmann... A extraordinária canção brasileira da geração dos anos 60, Tom, João Gilberto, Paulinho da Viola, Jorge Ben e Jorge Mautner, Jards Macalé, Chico, Gil, Tom Zé, Caetano... Mais a música de Debussy, de Mozart, de Bartók, dos Stones, enfim, o mundo de que me cerco (falta muita coisa nessa listagem, cito de impulso). Sugestão literária no sentido de que autores ler? Bom, acho que o caminho individual de cada um deve ser feito com discernimento, boa capacidade de leitura. Ah sim e ler, na medida do possível, os críticos, as discussões teóricas sobre poesia. Não ter medo disso é muito importante, até porque boa parte da crítica de poesia (talvez a melhor, acho que Pound e os concretistas têm razão) é feita pelos poetas em seus próprios poemas. Essa é uma das lições inalienáveis da modernidade, de Poe/Baudelaire pra cá. Além disso, é só evitar levar a sério a leitura de porcaria poética, de má poesia, de livros ruins.


Lohan: Qual mensagem você deixa aos poetas dessa Grande Final? Qual caminho (caso haja) um poeta deve trilhar para ter sucesso nessa carreira?


Roberto Bozzetti: A mensagem já foi ali em cima, não é? É ler ler ler ler ler, escrever, cortar e reservar pra ir decantando. Por aí. Agora, acho fundamental não ter pressa em publicar também, resistir à tentação de ter o livrinho com seu nome e fotinha e tal, curvar-se a essa tola vaidade – a que ninguém é infenso, mas é tola vaidade sim e, obviamente, é ruim. Legal é ir publicando em blogs, em sites, em veículos para isso (que hoje existem aos montes), abrir-se para discutir sua poesia com outros poetas e não-poetas, discussões que contribuam para o processo de criação. Mas quando eu digo “abrir-se” é abrir-se mesmo. Não se melindrar com críticas, não se deixar levar por elogios fáceis, não acabar fazendo do convívio pretexto pra textinhos laudatórios e/ou ressentidos do que e de quem não merece. Em boa medida, quem faz poesia – quem faz qualquer atividade que envolva produção de conhecimento, seja da forma que for, ainda mais no Brasil – deve habituar-se, sobretudo, ao silêncio como resposta. É um tanto perturbador, mas é concreto. Não tem como fugir. Caminho pro sucesso não sei não, nem estou interessado. Aliás, nem sei o que está embutido nessa expressão aqui empregada.


Lohan: Pra terminar, Roberto, o que é poesia?


Roberto Bozzetti: Ah, esse gran finale vai ficar com gosto de anticlímax. É fatura, como o nome grego indica, é o que se faz com a linguagem. É a mais aguda forma de consciência de linguagem, como modernamente ficou claro. É empregar seu esforço em nome do que é belo por ser, entre outras coisas, gloriosamente inútil, num mundo que padece de (foi Nietzsche quem disse? a conferir) excesso de utilidade.

0 comentários:

Postar um comentário

Dê a sua opinião!
Mas LEMBRE-SE: comentário de conteúdo ofensivo será eliminado do blog.

Twitter Delicious Facebook Digg Stumbleupon Favorites More